A vontade iminente de ficar só era plausível. Não sei se para resolver ou concluir algo, ou somente estar. Mas era assim que seguia os dias de profundo lamento. Sobrecarregada de muitas decepções e cansada das histórias passageiras - que duravam no máximo um mês. Perambulava, por aí, sem rumo. Há muito tempo já havia se conformado com essas paixonites. Um dia conhece, no outro ama e uma semana depois já está tendo que esquecer. E, assim, num ciclo interminável, desde então. Colocara na cabeça que nada é eterno, duradouro. Seguindo a linha e propósitos de Sócrates, a razão era posta no topo da pirâmide arquitetada por ela. Separava e organizava os objetos segundo critérios e os moldava, todos. Logo abaixo da razão, aí sim vinha paixão, começo, início e fim. A meu ver, segregações infelizes. Uma pena que tenha se submetido a tamanha reduções: sentir menos, demonstrar menos e ser menos. Se ela soubesse o desperdício que é minimizar-se....
Mas voltemos a ela, que é o que interessa. Ela já sabia como agir em todos os relacionamentos - guardava tudo dentro dela para agir, para só expôr o que o cérebro enviasse. Contudo, apesar dessas arrumações pré-determinadas, em algum momento ela tinha que cuidar das arestas que machucavam e engolir o que doía. Mas, calma. Ela já tinha esse momento. Era justamente quando ela se punha a dormir. Nesse dia não seria diferente. Chegou exausta do trabalho e das dores calejadas da vida e dormiu ansiosamente. Nos sonhos ela sentia-se confortável e transparente. Ali ela podia expressar tudo o que sentia, sem a necessidade de negligenciar o seu coração. Esse era o seu momento. O momento de ser, de viver, de agir. Entregava o que a movia e o que a contia. No seu cantinho de fantasia estava a vida e o amor que ela tanto buscara durante toda a sua cansativa e obscura caminhada. Ali possuía seu amor, que já vinha a acompanhando a pequenos vinte anos. Contrariava a lei da vida: o amor não ia sendo levado junto ao tempo que se alastrava. Cada dia era único, diferente. E o amor? Esse cada vez ficava mais forte e entrelaçado em um nó que eles haviam feito nas juras e promessas lá do início. Intocável. Há mais ou menos desde quando ela havia permitido diminuir-se em sua vida real. Só havia uma coisa triste que permeava os dois. O momento diário da despedida. Estava perto do (infeliz) despertador tocar a fim dela levantar para ir ao trabalho.
Ela: Não quero voltar a minha vida real. Quero ficar aqui, com você. Aqui não há espaço para rancor, fingimentos e constantes desapegos. Porque será que eu sempre tenho que acordar na melhor parte do sonho?
Ele: Pra você correr atrás e realizá-lo.
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