Fim de dia. Contrariando anos de contínuos lamentos, as coisas parecem aquietar-se diante de uma paz que surpreende e que há muito, ou melhor, nunca foi possível. Que mistérios cercam a nossa incapacidade de enxergar além de nossas dores? Como se explica a alegria repentina, a paz configurada, a esperança que chega sem aviso, que se instala ali, integralmente, expulsando a negatividade, o ciúmes e a desconfiança a que é tão fácil acostumar-me e que nos faz perguntar: por que não foi possível nos curarmos antes?
Durante um certo período da minha vida, na verdade, durante a maior parte dela, afirmava e assinava embaixo ser uma pessoa ciumenta. A linha existente entre o ciúmes e a desconfiança é tênue, quase imperceptível. Perdi muito tempo, caminhei lado a lado com a ansiedade mordaz e as noites mergulhadas em devaneios. Achei que essa era a minha sina: sentir ciúme. Ser ciumenta. O que não percebia, por egoísmo ou orgulho, é que estava dando passos falsos e caindo em buracos sem fim. A livre sensação de caminhar sozinha pela casa, andar saltitante, era uma hamornia estranha, mas absoluta. Maldita insistência em cultivar a infelicidade.
Depois de um certo tempo, por escolha minha ou imposição da vida, percebi que as minhas verdades eram infundadas. As minhas escolhas eram erradas. Os meus desesperos eram dispensáveis. A minha amargura envenenava a mim mesma, por fim a nossa dor não deve ir além do que já doeu. O problema não estava nos outros, mas sim, em mim. Difícil admitir. Constatei que o que senti durante todo aquele tempo não era ciúmes. Possuía outros nomes: insegurança e desconfiança. Quando comecei a me permitir e a perceber que a paz existe no interior de nós mesmo é que comecei a notar que o mundo está aí repleto de sentimentos inexplorados, histórias não contadas, corações a serem preenchidos.
Ampliei os olhos. Abri meu coração. Em uma calmaria e amor-próprio construídos por imposição da vida, encontrei alguém que mudou todos os meus conceitos. Na verdade não o encontrei, ele já permanecia ali. O tempo todo, só eu não tinha me permitido enxergar. A paz, conforto e confiança são palavras que começaram a fazer parte de mim. E quando se há isso, não existe espaço para nenhum sentimento ruim. Inclusive aquele ciúme, que deixei perdido no início do texto, meio blasé e nada cabível, aqui no fim. Pude perceber a diferença minuciosa de ambos. Porque quando existe confiança não há espaço para sentimentos secundários. Lá confusão, aqui calmaria.
"Confiança gera conforto"- Fabrício Carpinejar
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